SEJA VOCÊ TAMBÉM UM ASSOCIADO DO CLUBE DO CHORO DE BH. MAIORES INFORMAÇÕES LIGUE (31)3422-4433.

7 de julho de 2020

"Flor Amorosa" é o tema do segundo episódio do projeto Abre a Roda nas Redes e vem assinado por Alice Valle.

"Flor amorosa" é o título do segundo episódio do projeto Abre a Roda nas Redes. O texto assinado pela flautista Alice Valle nos conta sobre questões curiosas acerca desta composição de Joaquim Callado com letra de Catulo da Paixão Cearense.
Através deste projeto, o coletivo Abre a Roda Mulheres no Choro propõe nos trazer um pouco do universo da música e do Choro através de textos, vídeos e lives. 
Todos os conteúdos são elaborados através de muita pesquisa e da vivência de mulheres musicistas com vontade de trocar experiências e exercer o protagonismo feminino nessa rede virtual. E o resultado tem sido maravilhoso. 
Siga o Abre a Roda Mulheres no Choro no Instagram e conheça mais sobre este e outros projetos do coletivo.



FLOR AMOROSA
Por: Alice Valle

"Muitas vezes, por causa de um detalhe ou acontecimento inesperado, a história que deveria ser escrita é transmitida de outra forma. É engraçado pensar no que poderia ter sido diferente e influenciado gerações de outra maneira. Um exemplo disso, no cenário musical, é a música Flor Amorosa, de Joaquim Callado."

"Flor Amorosa" - Choro de Joaquim Callado e letra de Catulo da Paixão Cearense
Por Abre a Roda Mulheres no Choro com a participação de Paulo Prot na gaita.

A versão dos fatos que nos é contada hoje se apresenta com um ou alguns pontos de vista que prevaleceram sobre o emaranhado de realidades que compõem a história. Muitas vezes, por causa de um detalhe ou acontecimento inesperado, a história que deveria ser escrita é transmitida de outra forma. É engraçado pensar no que poderia ter sido diferente e influenciado gerações de outra maneira. Um exemplo disso, no cenário musical, é a música Flor Amorosa, de Joaquim Callado. Essa polca que é uma das músicas mais conhecidas do choro, hoje é umas das referências do gênero e é tocada até em outros países. 

Em uma breve pesquisa por sua história e de seu compositor, me deparei com informações limitadas, que se mostravam muito rasas e sem comprovação de veracidade. É fato que Callado foi um músico e compositor importantíssimo, porém ainda existem muitas lacunas em seus dados biográficos. Em um artigo, Marcelo Verzoni (2016) aponta que o fato do compositor ter vivido apenas 31 anos influencia, até certo ponto, na precariedade do material disponível. 

Em relação à música Flor Amorosa, sua peça mais popular, observamos várias questões curiosas. Verzoni (2016) explica que ela foi publicada onze dias após sua morte em 1880 e anos depois recebeu letra de Catulo da Paixão Cearense. Ela é referida por alguns autores como polca-canção, porém Callado imaginou-a simplesmente como polca instrumental. O professor Siqueira levanta outras questões sobre ela:  o observador quer saber, por exemplo, em que condições foi publicada essa peça deixada inédita, talvez até com outro título, bem como se houve ou não algum abuso no momento da publicação por interferência de elementos saudosistas ou interessados na repercussão popular do acontecimento. 

Essas cogitações baseiam-se em dois fatos importantes: primeiro, ter sido a obra impressa logo depois da morte do artista; segundo, o encontro de uma polca, no caderno de flauta do ex-professor do Instituto Nacional de Música, Pedro de Assis, com a mesma música e nome diferente, copiada em 1893. Esse conhecido mestre foi também professor de um neto de Callado, de nome João Damasceno. 

[...] A polca A Flor amorosa, publicada simultaneamente por duas editoras, trazia uma ‘terceira parte’ com um trecho completo retirado da Marcha Fúnebre, de Chopin. A incerteza gera nova exigência crítica: teria o grande flautista sido inspirado por uma força superior em forma de premonição? [...] A crítica desconhece a responsabilidade do autor da música pois estava sepultado quando a edição foi lançada no mercado. 

É preciso reconhecer ainda que, naquele tempo, era muito comum uma polca somente com duas partes: a terceira era improvisada no momento, quando não, deixada para uma exibição da harmonia expressiva dos tocadores de violões. [...] Já na segunda metade do século passado os autores nacionais começaram a escrever polcas com duas seções melódicas e uma de interesse modulatório, não apenas no tom vizinho senão também com aglutinação de passagens cromáticas, evanescentes das resoluções excepcionais. [...] (Siqueira, 1969, p. 124-125) 

A partir desse trecho, Verzoni (2016) entende que a problematização acerca da terceira parte da música é relevante. Seguindo a ideia de que todas as outras polcas de Callado tinham três partes, sugere a possibilidade do compositor ao falecer, ter deixado a peça incompleta, se considerarmos que a terceira parte tenha realmente sido acrescentada por outra pessoa. 

A partir disso, reflito sobre a importância dos historiadores nessa eterna busca por outras "verdades" e pontos de vista na história para vários fins. Desde fazer valer e dar voz às realidades daqueles excluídos das páginas dos livros até seguir escrevendo nossa história com mais consciência. Se nós cavarmos, encontramos inúmeros exemplos de mulheres e homens que foram vidas subversivas em atos, palavras e música. Eles não serão esquecidos.


Numa parceria com o site do Clube do Choro de BH os próximos conteúdos do Abre a Roda nas Redes também serão disponibilizados por aqui. Fiquem atentos e acompanhem.

Leia Também: Abre a Roda Mulheres no Choro lança novo projeto cultural e o primeiro episódio nos chega "Falando de Maxixe".